Newsletter - 20/09/24
- Lívia Vitenti
- 20 de set. de 2024
- 2 min de leitura
Realismo mágico, outra paixão.

Desenho Elza Fiuza.
Trilha sonora para essa edição: Aguas da Amazonia: Metamorphosis 1, Philip Glass, Uakti
Salve, salve
A personagem principal do livro que estou concluindo é um monstro. Ou um ser mitológico, ou o que eu quiser. E o que você quiser também.
Na minha última newsletter, falei sobre minha relação com o surrealismo e de como exercito minha escrita a partir de ideias propostas por esse movimento.
Mas uma dúvida ficou me martelando desde então: qual é o lugar do realismo mágico na minha escrita? Afinal, por que eu associo os dois? A resposta é meio óbvia, Gabriel García Márquez também foi presença constante na minha vida de leitora, principalmente durante minha adolescência, assim como os surrealistas, e ainda que sejam movimentos literários diferentes, na minha experiência, se irmanaram e moldaram minha forma de (querer) escrever, principalmente quando deixo minha intuição dominar.
Só que ao ler e reler o que tenho escrito até agora, percebo que o que predomina é essa tendência a escrever sobre o irreal, o inverossímil, o mágico como algo comum, quase cotidiano. É como se eu quisesse dar uma atmosfera de sonho, em uma prosa que se quer poética.
Fui então estudar mais a fundo o que é o realismo mágico, principalmente para diferenciá-lo do gênero fantasia, e fazer as pazes com essa faceta da minha escrita. Nada contra a fantasia, mas eu já não me interesso tanto por ela. Me interesso antes por esse movimento com tantas vozes, tantas expressões, que transforma a vida cotidiana, a dramatiza, a vira pelo avesso, usando sim meios comuns à fantasia, mas com um objetivo diferente, procurando antes aproximar-se do que se distanciar da realidade, a transfigurando.
Trago então para vocês uma reflexão de como eu uso - antes mais intuitivamente, agora com mais consciência - o realismo mágico. Primeiro, entendi que ele me ajuda a criar um novo cosmos, outras realidades, ou outros universos possíveis.
Ou seja, coloco na escrita temas que podem ser subvertidos, como tempo, memória, desaparecimento, sonhos, espelhos, sumidouros, coincidências e vaticínios. Estabeleço através deles um vínculo com a realidade em que vivo, propondo, entretanto, uma linguagem metafórica, onde o inconsciente vai predominar em relação ao racional.
Na minha história, então, trago verdades travestidas de sonho ou de epifanias. Minha intenção é revelar algo que, de outra forma, não seria percebido. Ilá, minha personagem, é transgressora. E sua transgressão se inicia justamente ao se opor a um sistema que há muito se instalou e que precisa ser questionado. Só que ela fará isso expressando uma compreensão singular da realidade, fazendo com que a realidade se manifeste de maneiras que serão muitas vezes surpreendentes e fora do lugar, mas ainda assim reconhecíveis.
Se isso é realismo mágico, não sei. Entendi que esse movimento não se encaixa em uma só definição. Só sei que gosto de como as artes que se identificam com ele me fazem sentir e quero poder transmitir esse sentimento para o mundo. Pode ser esse aqui mesmo.
Até breve,
Lívia
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