newsletter - 18/04/25
- Lívia Vitenti
- 18 de abr.
- 2 min de leitura
“Amor, então
também, acaba?
Não, que eu saiba.
O que eu sei
é que se transforma
numa matéria-prima
que a vida se encarrega
de transformar em raiva.
Ou em rima.”
Paulo Leminski

Trilha sonora para essa edição: Finale - Tango Apasionado, Astor Piazzolla
Salve, salve,
Eu penso muito nessa poesia. Penso muito em quanto pode durar uma inspiração. Porque se o amor que não se transformou em raiva, se transformou em rima, ele pode servir de fonte durante muito tempo. Isso acontece comigo. E acontece com um amor que primeiro se tornou raiva, e só muito tempo depois se tornou rima.
Em dezembro deste ano fará 20 anos que eu não vejo a pessoa que me inspirou a escrever, por muitos motivos. De fato, esse homem é uma das personagens mais importantes do primeiro romance que escrevi. A personagem principal se chama Cecília. Ele ter protagonismo na história não significa que ainda pense nele como um objeto do meu desejo. Já o desejei muito, é verdade. Já o amei demais. Amei de um jeito doido mesmo, e entendi muita coisa sobre mim por causa dele. E ainda estou entendendo.
Em 2004 duas mulheres, em duas situações completamente diferentes, me disseram que eu conheceria alguém que mudaria minha vida para sempre. Não é de se estranhar que eu achei que essa mudança seria positiva, e vendo em retrospectiva, acho que foi, apesar de todo o sofrimento. O que acontece é que depois dele, eu nunca mais conheci ninguém igual, e isso é bom. Eu realmente não gostaria de ter conhecido outro Nicolás. Hoje entendo que a mudança que sua chegada promoveu na minha vida foi realmente a de estar mais atenta aos meus limites, ao espaço que eu dou aos outros, à minha disponibilidade. Mais importante ainda, me atentar para quem e quanto eu posso me mostrar vulnerável.
Nosso encontro aconteceu em 2004 e não durou muito mais que um ano. Mas até hoje evoco nossa relação para pensar em contos e poesias. Porque o que senti, e ainda sinto por ele, pelo encontro, pela relação, pela experiência em si, foi tão intenso, tão definitivo, que seria impossível dizer que não foi importante só porque não durou muito.
As mais entendidas dirão isso é uma resposta ao trauma, e pode ser que elas tenham razão. Ao mesmo tempo, penso que é muito bom poder evocar sentimentos e traduzi-los em palavras, sem necessariamente voltar a sofrer ou se angustiar. Porque eu só evoco o sentimento, não volto a sentir. É sim uma re-experiência, uma possibilidade de reproduzir em minha mente algo já vivido, sem reviver a dor.
Acho que usar o que nos fez sofrer em algum momento pode ser bom não só para ressignificar a experiência e fazer com que ela pare de nos vitimizar, mas também para transformar algo que um dia nos feriu, em inspiração.
Até breve,
Lívia
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