Newsletter – 17/05/24
- revistasarabatana
- 17 de mai. de 2024
- 3 min de leitura
Essa é a Newsletter da Revista Sarabatana, enviada semanalmente, sempre às sextas-feiras.
“Certas canções que ouço
Cabem tão dentro de mim
Que perguntar carece
Como não fui eu que fiz (…)”
Nos diz Milton Nascimento, e ao fazê-lo, expressa algo que talvez esteja dentro de muitos entre nós. Quem não já se pegou pensando: poxa, como é possível que essa pessoa tenha dito isso exatamente da mesma forma como eu sinto? E se isso vale para a música, também vale para a literatura.
Aliás, o que há de tão cúmplice entre essas duas artes? Eu sou uma voraz apreciadora dos cantautores, mais conhecidos no Brasil como cantores-compositores, e muitas vezes me peguei imaginando uma história bastante elaborada a partir de algumas músicas. Costumo até brincar que tenho um musical pronto na minha cabeça. Por exemplo, eu tenho certeza que o Cartola primeiro cantou Acontece para a mulher que estava deixando, para depois cantar Tive Sim para a nova companheira. Como esse, tenho muitos outros exemplos na caixola, mas isso fica para uma conversa de bar um dia!
O que estou dizendo é óbvio: a canção é um gênero literário, que podemos definir como um texto elaborado sob diversos critérios rítmicos e linguísticos para ser cantado. A palavra lírica, com ressonâncias musicais, é usada para designar certas formas literário-musicais, a canção propriamente dita, e para se referir a todos os tipos de poesia que não são narrativas nem dramáticas. Pensando por uma lente antropológica, posso argumentar que a poesia, a canção e a música são expressões fundamentais do ser humano, embora com suas diferenças culturalmente localizadas. Digo isso porque essas estão presentes, e são persistentes e consistentes ao longo dos séculos na maioria – quiçá todas – as sociedades humanas de que temos notícia.
Mas e a música como um gênero literário? É um conceito intrigante para você? Como já disse, para mim, uma maneira de ver a música como um gênero literário é analisar as letras das músicas como uma forma de poesia. Muitos compositores usam artifícios poéticos como metáfora, imagens, rima e ritmo para transmitir suas mensagens e evocar emoções nos ouvintes. Por isso, letras de música podem ser entendidas como uma forma de literatura, expressando temas, narrativas e ideias da mesma forma que um romance ou um poema. E eu nem precisaria mencionar determinados gêneros musicais, como a ópera e o teatro musical, como exemplos de narração semelhantes aos da literatura.
E o contrário? É possível usar a música como uma ferramenta para escrever? O que serve para você? Ajuda, atrapalha, inspira, dispersa? Listei aqui como a música ajuda no meu processo de escrita, quem sabe algumas dicas servem para você também!
Investigo meu estado de espírito e coloco uma música para definir o tom das minhas sessões de escrita, que podem, sim, durar só o tempo de uma música. Por exemplo, ouvir Dead Can Dance me ajuda a criar cenas reflexivas ou melancólicas. Música clássica, jazz ou música minimalista, como Philip Glass, são boas companhias para temas mais filosóficos.
A música instrumental me suscita sentimentos, enquanto as canções estimulam minha criatividade. Ambas me inspiram, evidentemente, mas ouvir uma música que tenha ressonância com os temas ou a atmosfera de uma história que eu esteja escrevendo me ajuda a gerar ideias e dar novos rumos à escrita.
Ponto polêmico agora: ouvir música aumenta minha concentração! Mas não é qualquer música, pois mesmo as instrumentais podem ser fonte de distração para mim também. Idealmente, escuto músicas que conheço muito bem, ou as que têm ritmos que se repetem, que ajudam minha imersão no processo de escrita.
Músicas que me auxiliam a criar ritmo e fluxo. Outro dia estava escutando En la Alcoba, de Gustavo Santaolalla, e saiu um poema que, por mim, seria a letra dessa música. O que quero dizer é que, assim como a música tem ritmo e estrutura, a escrita também tem. Nós escritores podemos usar a música para estabelecer um andamento em nossa escrita, alinhando a prosa ou a poesia com a cadência da música que estamos ouvindo.
Por fim, certas músicas ou gêneros musicais evocam cenários, períodos de tempo ou traços de caráter específicos para meus personagens. Penso que nós escritores podemos usar a música para explorar e desenvolver nossos personagens e cenários, desenhando o ritmo de nossa narrativa.
Para finalizar, deixo aqui a trilha sonora dessa newsletter, e algumas outras músicas de brinde. Espero que elas sirvam de inspiração para vocês também!
Até breve,
Lívia
Trilha sonora para essa edição:
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