
sexta-feira à noite é a tua melhor hipótese
Cobramor

outros antes de nós tentaram e falharam
aquela voz na madrugada não te deixa dormir
o insistente e imponente sonho da sociedade a ruir
o dia aterrador espera para esmagar o cérebro com o martelo pneumático da
monotonia e o automatismo sem consciência
corpo resumido ao toque
espera sexta-feira à noite como pela salvação onde o melhor milagre que conseguimos
conjurar é o esquecimento narcótico &
a desesperança que te lança no abismo
reza
pelo cataclismo
nem bem acordado nem totalmente alienado
não é por amor ao dinheiro mas também é por amor e também é por dinheiro
o primeiro e maior inimigo a abater
detestamos o papel que representamos
tudo aquilo a que podemos aspirar
antes de expirar:
alguns anos de glória como compensação
que nunca compensará
um breve silêncio revela a hedionda face da gritante solidão afastamento apartamento
isolamento quando toda a empresa se cala
ergues os olhos para a sala e percebes
quão absurda é a existência, tarefas vãs ou contrarrevolucionárias &
a enfermidade da sobrevivência
crava a palavra
na carne
como prego na chaga
não meças as consequências dá um pontapé na cadeira atira o computador para o
corredor denuncia o chefe como o ditador que é
a natureza da hierarquia é a fria garra na jugular
reclamar o direito à preguiça
nele fundar religião
percorre as ruas descalço no encalço de um poema épico
contra o feudalismo tecnológico
por estar condenado ao fracasso
mastiga bem cada pedaço
antes de engolir