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Sabrina Abreu*

Para abrir nossa sessão de entrevistas, conversamos com Sabrina Abreu, que generosamente compartilhou conosco seus processos e relações com a escrita. Como todos os seus textos, essa entrevista é leve e gostosa. Uma honra!

Como foi o processo de se tornar escritora? 

Meu pai escreveu diários durante a vida toda e continua a escrever ainda hoje. Ele sempre quis que eu e minha irmã fizéssemos o mesmo, e eu fui a que aceitou o conselho. Comecei aos oito anos e nunca parei. Foi esse hábito que me iniciou na mágica da escrita. Quando você narra algo, ainda que seja sua própria vidinha de criança ou adolescente, experimenta, por um lado, uma sensação de controle, porque é sua visão dos fatos, e, por outro, tem contato com uma fagulha de criatividade que surge quando você começa a encontrar a palavra exata para um sentimento ou a refazer uma frase para ela soar mais simples. Conseguir isso pode parecer pouco, mas era uma vitória cotidiana e viciante. Ainda é. 

Na escola, as professoras e professores de português frequentemente destacavam minhas redações, de vez em quando as liam em voz alta. Lembro de sentir orgulho disso. Era uma alegria constatar que era capaz de fazer algo bem, enquanto era ruim em tanta coisa – com destaque para todos os esportes coletivos inventados pelo homem. 

Da intimidade com a palavra, vinculada aos meus diários, e dos elogios que eu recebia em casa e no colégio ao que eu escrevia, veio o impulso, mais tarde, de escolher cursar a faculdade de jornalismo. Não porque eu quisesse ser jornalista, queria ser escritora e não conhecia outro caminho para tentar isso. No fim, foi uma opção acertada, e também acabei me apaixonando pela vida de jornalista. 



Qual o espaço da escrita na sua vida?

Acho que o melhor jeito para eu explicar o espaço que a escrita ocupa na minha vida é lembrando que todas as escolhas mais importantes que fiz, desde a adolescência, tiveram como base uma questão central: “Se eu fizer isso, vou chegar mais perto do meu sonho de ser escritora?”. Foi assim que comecei a trabalhar em redações de revistas, em busca de histórias que pudesse contar e do meu nome impresso no papel, uma experiência que eu amava. Mais tarde, foi também para continuar meu caminho em busca de uma escrita autoral que abri mão do meu espírito de repórter, mesmo isso sendo doloroso.

Desde então,  comecei a escolher outros trabalhos, que não “competissem” com minha escrita autoral e que, ao mesmo tempo, pudessem me manter, sem tirar de mim o tempo de criação. É um equilíbrio delicado. E complicado. Mas tem funcionado, porque não existe mesmo outra opção. Eu preciso escrever. 



Como é o seu processo criativo? Você tem rotinas de escrita?

Quanto ao tema, o processo para encontrar uma nova história é baseado na minha obsessão. Se eu só conseguir pensar naquilo, fico certa de que tenho que escrever a respeito. Pode ser um lugar, como Israel,  país onde vivi, pelo qual sou apaixonada e tema de dois dos meus livros. Pode ser uma pessoa, como Rene Silva e Ronaldo Fraga, personagens a quem dediquei dois outros livros.

Se eu estiver com um livro em andamento, escrevo à noite e reescrevo pela manhã. O jornalismo me ajudou a cortar e a editar sem dó, o que eu faço rigorosamente tão logo pego o texto no início do dia. 

Em livros de não ficção minha checagem é bem paranoica e eu tenho um método de entrevistas que implica muitas horas de conversa até eu saber que o entrevistado está realmente à vontade comigo. Em “A Voz do Alemão” (nVersos, 2013), convivi no Complexo do Alemão por um ano e dois meses, para conseguir entrevistas mais genuínas. Com Ronaldo Fraga, realizamos um projeto que propus nos moldes do livro “Conversas com Woody Allen” e fizemos dezenas de entrevistas, entre 2014 e 2020. Não tenho pressa. 

Porém –, e esse é o meu último traço repetitivo em todos os processos, porque não sou uma pessoa metódica – chega uma hora em que eu me canso um pouco de esperar, que a história, de ficção ou não ficção, em verso ou prosa, parece que pede para sair. Num dia, estou protegendo aquilo, escolhendo nos dedos pessoas com quem compartilhar. De repente, noutro dia, estou com dores de parto, preciso deixar ir. É um siricutico mesmo que me dá, não porque esteja perfeito, eu sei que mais  tempo sempre é igual a um acabamento melhor em cada frase ou capítulo. Mas é que uma história específica já merece nascer, apesar de suas imperfeições, e, quem sabe, com sorte, outras histórias vão chegar para mim, se eu deixar essa ir. 

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Como você define o que escreve?

Escrevo ficção e não ficção. A não ficção é mais fácil de definir: eu conto histórias que me interessam  loucamente e que me levam a lugares e pessoas onde, de outra forma, eu não estaria. Foi assim com “Meu Israel” (Leitura, 2008), meu primeiro livro de viagem e de entrevistas, e com  “A Voz do Alemão”, uma grande reportagem.  Como vim do jornalismo, esse é um local tanto prazeroso quanto mais seguro para mim, mas eu sempre tive mesmo o sonho de escrever romances.

Publiquei o meu romance de estreia em 2017 (“O Último Kibutz”, Simonsen), então também sou ficcionista. E, por fim, de modo muito inesperado, comecei a compartilhar versos no Instagram, durante a pandemia. Nunca pensei em fazer isso, mas foi um reflexo daqueles dias estranhos – eu não tinha muita cabeça para coordenar parágrafos, mesmo querendo muito investir na prosa. O projeto “Notas Isoladas”  deu origem a meu sexto livro “Parece pausa, mas é travessia” (Gulliver, 2021). É um livro de poesia, então … eu também sou poeta? Vai saber. 



Quais são suas influências?

Minha maior influência foi o Fernando Sabino. Quando li “O Encontro Marcado”, aconteceu uma revolução na minha cabeça de aluna da oitava série do Colégio Batista Mineiro. Eu  tinha 14 anos. É um livro sobre escrita e sobre amizade, que, desde essa época,  já sabia seriam alegrias centrais da minha vida. Acho que eram os meus dois talentos de adolescente: escrever e ser enturmada. 
 
O Eduardo Marciano, personagem principal, assim como o Fernando Sabino, era belo-horizontino. BH é uma cidade grande, mas meio estranha, porque, para o bem e para o mal, seu charme e seu defeito é o provincianismo. Realmente, foi no Rio que Sabino e sua geração explodiram como grandes nomes da nossa literatura, não existia caminho para isso fora do Rio, naquele tempo. Mas ele era uma pessoa de BH, e isso me fez pensar que também poderia ser escritora.

Como o personagem do livro e por causa dele, eu optei pelo jornalismo como um caminho até a literatura. Fiquei tão encantada pelo Fernando Sabino, que li tudo o que tinha dele na biblioteca do ICBEU, meu curso de inglês da época. Um dos livros era de entrevistas. Sabino entrevistou Salvador Dalí! Eu sonhava acordada com essas chances, chegar perto de pessoas admiráveis e conhecê-las, conversar com elas, depois escrever a respeito e ainda ganhar a vida com isso. Impressionante como nosso mundo inteiro pode ser moldado a partir do encontro com uma autora ou um autor. Eu até me emociono pensando nisso tanto tempo depois. Foi graças ao Fernando Sabino, ainda que ele nunca tenha sido informado disso, que entrevistei Zuenir Ventura, Vik Muniz, Millôr Fernandes e tantos outros. 

E, mais uma camada desse encantamento teve a ver com o fato de, por muito tempo, os homens parecidos com o personagem Marciano me atraírem profundamente. A indecisão do personagem me cativou até a época da faculdade ou um pouco depois, seu andar aos tropeços pela vida, os abismos entre o querer e o conseguir fazer algo direito, falhando em quase tudo, menos na escrita e nas amizades. 

A indecisão de Eduardos Marcianos – no plural, porque eles são muitos e existem vários de carne e osso por aí – sempre me chamou a atenção e cativou, mas não conseguiu me contagiar. Ao contrário, eu estava decidida, aos 14 anos, a tentar ser escritora, assim como hoje continuo decidida a tentar ser lida por mais gente. 



Que livro você gostaria de ter escrito? Por quê?

Eu sei que Woody Allen está cancelado, mas sua obra é uma parte indissociável da minha formação (não consigo imaginar a vida sem Annie Hall e Manhattan). Toda essa introdução é para dizer que o livro que eu sonhei em fazer era “Conversas com Woody Allen”. Nele, o jornalista americano Jonathan Lax entrevista longamente Woody Allen, por longos anos e anos, sobre cada um de seus filmes. Como eles vão se tornando próximos ao longo da conversa, acaba surgindo espaço nas entrevistas para falar  também de família, religião e jazz. 

Amo esse livro, desde que o li pela primeira vez. E releio sempre. Foi a partir dele que tive a ideia de fazer um livro de entrevista com Ronaldo Fraga, também ao longo de anos e visitando cada uma de suas obras. Já havia entrevistado Ronaldo duas vezes e já tínhamos nos visto numa ou noutra ocasião, mas estávamos longe de ter algum tipo de vínculo. De todo jeito, enviei um email, perguntando se ele topava fazer o livro comigo, e ele topou. De 2014 até 2021 trabalhamos juntos no livro. Também nos tornamos amigos, como eu sonhava lendo “Conversas com Woody Allen”. O livro sai em março, se Deus quiser. Está aí um sonho realizado. 
 

*Sabrina Abreu é jornalista e escritora com seis livros publicados. O sétimo, “Memórias de Um Estilista Coração de Galinha”, livro de entrevistas com Ronaldo Fraga, está no prelo e vai sair pela Autêntica Editora.

A foto da autora, de seu arquivo pessoal, é de @pattypenna.

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