
A vendedora de vozes
Grazielle Mendes

Vendo vozes. Vozes. Puro som. Imagens não estão incluídas, ficam por sua conta.
Tudo depende do que sai e fica com a palavra. Veja o pranto. Quando rebenta junto, derrama sílabas. Se fica preso, engole pausas até recuperar o ar.
Pipa só tem barulho de criança se tiver céu para brincar.
Morte é confissão de alívio ou grito de dor.
Vida rompe no primeiro choro ou na última súplica.
Só a palavra falada engasga, erra o caminho e pega atalho de volta, na mesma frase.
Só a palavra falada estica a duração do gol.
Só a palavra falada tem pressa, orgulho, vergonha.
Só a palavra falada abraça, escuta e canta.
Só a palavra falada desafina. Se for mentira não, melodia perfeita.
A preferência é por caixas pequenas, que embrulham vozes comprimidas para caber nas expectativas dos outros.
Por isso, encolho tudo, até o que não tem tamanho.
É uma agonia.
Sempre sobram vozes na minha cabeça.
Por outro lado, são mais fáceis de carregar em porções.
Voz embargada pesa demais.
Tom de cinismo ninguém aguenta inteiro.
Timbre incoerente esgota a paciência.
Ódio sempre extrapola ruídos.
Até a alegria precisa vir em fatias,
para você querer mais um pedaço.
Vai por mim, esse é meu ofício.
Embalado em paixão e cansaço.