
Na casa de dentro
Cecília Rogers

Abro a porta da casa
cupins desfilam ávidos à minha frente
indiferentes ao sal no transbordar da lágrima
enquanto meus olhos clareiam cantos retiram o mofo
nos móveis escuros, no pó
rabiscos de uma menina
que brinca num castelo
e é uma linda princesa que um dia
será libertada daquela prisão
o velho no sofá lê
imerso nas sombras de dentro
o trabalho duro, os filhos para dar de comer
tudo guardado no silêncio do tempo
Abro a porta do quarto
lá na cama uma mulher
coberta por uma tristeza
que atravessa os santos
no oratório, uma reza pela salvação
“Ave, você que aqui vem
cheia de bem-querer
perdoa essa alma que sofre
tem piedade. Amém.”
A pequena cama azul
guarda os medos da criança
claro escuro claro escuro
por que esse barulho?
encontro no espelho a resposta
:não temas, a vida é sina é sal é espinho.